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Seis anos. Esse foi o tempo que levou para ser concluído, no Supremo Tribunal Federal (STF), um dos julgamentos mais determinantes para as milhares de comunidades quilombolas do Brasil: a votação da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3239, que pretendia alunar o decreto 4887/2003, responsável por regulamentar a titulação de terras quilombolas no país.

 No dia 08 de fevereiro de 2018, o julgamento chegou ao fim com uma vitória histórica para as comunidades quilombolas. Por 10 votos contra 1, o SFT decidiu pela manutenção da constitucionalidade do Decreto. Durante o julgamento, também foi afastado a aplicação da tese do “marco temporal”, que prevê que o direito constitucional quilombola ao território se estenderia apenas às áreas que estivessem efetivamente ocupadas em 5 de outubro de 1988 – o que impediria o acesso efetivo das comunidades a seus territórios.

Com a decisão no STF, fica assegurado o único instrumento legal que permite a efetivação do direito ao território tradicional dessas comunidades. A conquista é fruto de um incansável estado de alerta e de mobilização das comunidades quilombolas do país, que carregam viva a resistência de seus ancestrais.

Givânia Maria, integrante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e da comunidade Conceição das Crioulas, localizada no município de Salgueiro, sertão de Pernambuco, destaca que “essa vitória é também uma homenagem a todos e todas que tombaram na luta, que morreram e não conseguiram ver o que nós estamos assistindo agora”. A liderança quilombola ressalta que "o resultado do julgamento foi a consolidação de uma luta de muitos anos". Primeiro, as comunidades quilombolas lutaram para que o Estado criasse um instrumento que garantisse o cumprimento do direito ao território. Depois, lutaram para que esse instrumento fosse considerado constitucional.

“Não tenho dúvidas de que as comunidades quilombolas e a CONAQ lutaram bravamente. Nesses anos, assistimos a lideranças chegarem à Brasília, sem dinheiro nem para pegar um circular [ônibus], para apresentar suas demandas e cobrar dos órgãos a efetivação das políticas. Se contássemos as mobilizações realizadas, as audiências públicas, documentos elaborados, conflitos, denúncias... Também não tenho dúvidas de que a CONAQ sozinha não conseguiria. As entidades que nos apoiaram tiveram papel fundamental, assim como as mídias sociais e os/as artistas”, destaca Givânia. “Hoje, o sentimento é de alegria e gratidão, mas também de alívio. Depois de vários anos de mobilização e de intensos debates, acredito que conseguimos consolidar alguns conceitos e direitos como o da auto definição e o de território”. Contudo, é preciso reconhecer que o desafio não acabou. “Para nós, a decisão no STF significou uma vitória na luta antirracista, mas o racismo não acabou, por isso precisamos continuar lutando”, afirma a liderança que considera a votação no Supremo um combustível para continuar acreditando namobilização quilombola.

Para a advogada da Comissão Pastoral da Terra, Gabriella Santos, ”é inegável a grande vitória do povo quilombola ao ter o decreto que garante a titulação dos seus territórios mantido por 10 votos a 1 no STF. Essa conquista, fruto de forte articulação e muita luta, se mostra ainda mais expressiva diante do contexto extremamente conservador vivenciado nos últimos tempos, inclusive no judiciário. Agora, resta o cumprimento do Decreto 4.887, da Constituição Federal e da Convenção 169, visando a efetiva titulação dos territórios das comunidades quilombolas em todo o país.”

Fernando Prioste, advogado da Terra de Direitos também considera que esse  “foi um julgamento histórico, talvez a maior vitória jurídica das comunidades quilombolas do Brasil em toda a história, e significativo, porque foi uma derrota acachapante contra os ruralistas e contra os Democratas, já que o Supremo Tribunal Federal, por ampla maioria, reconheceu o direito quilombola à terra.  Mas o desafio continua. Acredito que os ruralistas não vão desistir de se opor a pretensão dos quilombolas de reconhecimento de seus direitos e vão, como estão no momento, impedir as titulações. Agora, o  foco da luta deve mudar do judiciário para o executivo, para fazer com que este efetivamente titule as comunidades quilombolas. Essa luta talvez seja ainda muito mais difícil do que foi a luta contra a aprovação da ADI no Supremo".

“Diante da conjuntura jurídica e política, de democracia fragilizada, é necessário encontrar em resultados como este o fôlego para travar novas batalhas. Não é porque o STF votou favoravelmente às comunidades quilombolas que esse se tornou, da noite para o dia, um espaço progressista e garantidor de direitos. Porém, os setores mais conservadores, como a bancada ruralista, ficam um pouco mais acuados com o peso dessa decisão”, considera Eduardo Fernandes, advogado e professor e professor do Departamento de Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Eduardo ressalta, contudo, que “devemos ficar atentos às reações contrárias desses setores conservadores da sociedade. É hora de comemorar, de soltar o grito de ‘nenhum direito a menos’, que estava engasgado há tanto tempo, mas também é hora de manter a vigilância. Em tempos de golpe, é preciso ter um grande arco de articulação mobilizado, mais forte e amplo”, finaliza.